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ENTREVISTA

A ingenuidade do interior chega a me emocionar
27/03/2012 - Marcos Antonio Moreira - fazperereca@yahoo.com.br

Entrevista de Gabriel Novis Neves à jornalista Vevila Junqueira, edição de abril do Jornal do Conselho Federal de Medicina:

Médico mato-grossense, inspirado pelas letras, pela vivência com o pai e o avô e pela ingenuidade da vida no interior, Gabriel Novis Neves, 76 anos, é o Personagem Médico desta edição do jornal Medicina.

Formado pela Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ele enfrentou os desafios que enfrentam a maioria dos jovens médicos antes da consolidação profissional.

Recém-formado, iniciou a carreira no Rio de Janeiro, mas acabou optando por retornar à cidade natal.

“Chegamos, eu e minha mulher, aqui em Mato Grosso no dia 31 de julho de 1964 e encontrei uma casinha popular. Tinha 80 metros quadrados. Meus três filhos nasceram nessa casa. Eu assumi os piores cargos, aqueles que ninguém queria”, lembra.

A partir daí, construiu sua trajetória em Cuiabá. Modesto, atribui à sorte e a fatores circunstanciais a oportunidade de ter se envolvido em importantes projetos para o Estado, como a fundação da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e a atuação frente às secretarias de Saúde e Educação. Mas o fato é que o nome de Gabriel Novis Neves está impresso na história do Estado como um importante personagem. Defendeu uma universidade voltada para o desenvolvimento da região e, a partir desse ideal, a UFMT adquiriu prestígio nacional. Transformou oportunidades em empreendimentos respeitados em bem-sucedidos.

No seu caminhar até se formar médico, as figuras do pai e do avô foram decisivas. O pai foi quem o desafiou a buscar novas possibilidades de estudo:

“Eu não queria ser médico, o que eu queria ser era garçom do bar do meu pai, o grande centro de vivência e convivência de Cuiabá. Eu ficava molequinho ali, fui criado ali, ia servindo, achava uma diversão e ficava ouvindo a conversa. Esses nomes de rua aqui de Cuiabá, a todos eu servi cerveja. Eu fiquei tomando conta da sorveteria, fazia tudo, comprava baunilha, pegava leite da chácara, fazia sorvete de nata, sorvete de leite, sorvete de creme. Meu pai, que só tinha instrução primária, mas sabia o que era bom para os filhos, me viu crescendo e me entusiasmando com aquele universo. Mas aqui só tinha ensino médio, não havia perspectiva. Então ele me incentivou a cursar Medicina no Rio”.

O avô, médico otorrinolaringologista, foi outra importante influência.

“Eu ia fazer companhia para o meu avô e ficava no consultório. O mais comum eram casos de corpo estranho. Tinha a piraputanga, então tinha muita gente com espinha na garganta, e tinha crianças com feijões brotando nos ouvidos”, brinca.

“Eu achava uma enormidade o que o meu avô ganhava considerando o preço do picolé. E ele me falava que o sujeito pagava para 'quem sabia'. Então eu percebi que tinha que adquirir conhecimento para um dia receber um honorário digno”, relata.

A ingenuidade do interior também marcou a sua história e atuação. Do cenário mato-grossense partiu a inspiração para atuar como cronista. É colaborador em jornais locais como o "Diário de Cuiabá" e dono do blog “Bar do bugre”, criado em 2009, uma alusão ao bar do próprio pai.

No layout, uma foto em preto-e-branco revela o charme da antiga pracinha do centro de Cuiabá e a boemia de um chope com colarinho, marcas da espirituosidade e emoção de sua personalidade.

“Eu me preparei para ser médico, e médico do interior. O interior é muito rico, acontece muita coisa bela por aqui. A ingenuidade do interior chega a me emocionar”, diz Neves.

  

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