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TEMA LIVRE : Léo Medeiros

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Um Grito de Liberdade
27/01/2007

A Polícia tem sido no decorrer da história, instrumento de ação personalíssima do Governador, não do Governo, do Estado, do Povo.

Assim nos últimos tempos, aqui na Terra de Rondon, vimos a “Polícia do Julio”, “do Jaime”, do “Bezerra”, “do Dante” e, agora a “Polícia do Brairo”. E, em cada tempo, foi, e ainda é utilizada conforme os ditames doutrinários políticos de cada governante.

Só para ilustrar, num tempo considerado, a Polícia executava com presteza as determinações judiciárias de reintegração de posse; em outros, a decisão da ação para o mesmo fim do exemplo, era postergada “ad infinitum” sob os mais diferentes argumentos.

A lei e o direito valiam menos que um pequi roído, do que bananinha de bolicho, menos ainda do que penico de Santa Casa -com todo respeito a centenária Instituição.

Há mais de 170 anos a Polícia tem estado calada, quieta, subjugada por governos imperiais, republicanos, ditatoriais, democráticos e pseudodemocráticos, sempre como “o braço armado do Estado”.

De extrema fidelidade aos mandatários e governantes, a Policia , por dois séculos, aceitou ser vituperada, considerada corrupta, violenta, inescrupulosa, incompetente, ineficiente e mais uma ou duas dezenas de adjetivos que me fogem a lembrança.

Aceitou todos estes pejorativos sem, em nenhum momento, levantar a voz e gritar: “espera aí, eu sou tudo isso porque o governo assim o quer, porque enquanto o povo estiver com seus olhos voltados para minhas mazelas, não estarão vendo as falcatruas governamentais; enquanto a sociedade estiver reclamando que os índices de criminalidade estão aumentando e que eu não estou sendo capaz de resolver o problema, não estarão observando as Leis que estão sendo feitas para beneficiar este ou aquele amigo do governo”.

Exemplifico de novo, desde a edição da edulcorada “Constituição Cidadã”, e lá se vão anos, os artigos referentes a Segurança Pública ainda não foram regulamentados; as leis complementares existentes, vigoram naquilo que não contradiz o texto da lei Maior, é do tempo da “ditadura”, “dos anos de chumbo”.

Nenhum governo democrático, por incompetência , desídia ou má fé, moveu uma palha para corrigir a esbórnia, então gerada.

De que forma dizer para aqueles que tenho a obrigação de proteger que para fazê-lo terei, obrigatoriamente, que descumprir a Lei, ser autoritário, abusar de minha autoridade, cometer ilegalidades pois as Leis que foram colocadas à minha disposição, ao invés de ajudar, na verdade foram elaboradas para limitar o serviço policial.

Minha crise de consciência é tão grande que às vezes perco o sono tentando encontrar uma solução, principalmente, quando sou procurado por alguém que me diz: “... senhor policial, ontem eu fui roubado pelo meu vizinho e as minhas coisas se encontram na casa dele.

O senhor pode pegá-las e me devolver?”.

Com que cara eu sou obrigado a dizer para esta pessoa que terá que se instaurar um Inquérito Policial, ouvi-la, intimar as testemunhas para comparecerem na Delegacia após 24 horas, depois representar ao Juiz pelo Mandado de Busca e Apreensão, aguardar quinze, vinte, trinta dias pela decisão e, se o Mandado for expedido, ir até a casa do criminoso para, com muita sorte, recuperar os objetos roubados?

Qual a melhor maneira de dizer as vítimas de furto que não adianta coletar impressões digitais no local do crime porque no Brasil não funciona como nos filmes americanos.

Que não existe um banco de dados nacional de impressões digitais de criminosos arquivadas por um sistema monodactilar?

Que cada Estado tem sua própria Carteira de Identidade?

Que não existe um banco único de dados para consulta de Registros Gerais?

E quando alguém, cuja filha foi estuprada, lhe pergunta se é possível identificar o autor com o teste de DNA?

Como dizer para esta pessoa que ela pagou seus impostos em dia mas o Estado não faz teste de DNA, que isto só existe no cinema?

É tão fácil culpar o sistema policial pelo aumento do índice de roubos e latrocínios na cidade, afinal de contas parece que existe um verdadeiro êxtase por parte dos jornalistas em estampar nas primeiras páginas de alguns jornais:

“A POLÍCIA AINDA NÃO SABE QUEM MATOU A PROFESSORA PRIMÁRIA”,

“LATROCIDA ESTÁ A SOLTA E A POLÍCIA NÃO TEM NENHUMA PISTA” ou “O INDICE DE VIOLÊNCIA AUMENTA NA CAPITAL E A POLÍCIA CONTINUA INOPERANTE”.

Algum Governador seria tão honesto para, na frente das câmeras de televisão, confessar que as viaturas policiais que estão em ronda nas ruas são mantidas pelos policiais que, face a inoperância governamental, pagam os consertos dos veículos?

Que os policias são obrigados a comprar seu próprios uniformes?

Que os policiais não possuem, cada um, um colete “a prova de balas” que lhes proteja e lhes salva a vida nos confrontos armados com a marginalia?

Que o policial não tem seguro de vida, e, que ficará desamparado se levar um tiro e ficar paraplégico?

Que a viatura que o policial dirige está coberta pelo seguro?

Algum Secretário de Fazenda seria capaz de assumir que os policiais recebem baixos salário para não terem condições de conviver com pessoas das classes mais elevadas.

Para não poderem estar nos mesmos restaurantes, bares, boates, etc. e por conseguinte não poderem saber o que estas pessoas fazem?

Por que?

Por que se conviverem com os que possuem melhor renda conviverão com os próprios secretários, seus amigos e parentes.

Porque convivendo com os seus vão conhecer-lhes os hábitos.

Conhecendo seus hábitos vão descobrir os vícios.

Conhecendo os vícios vão prendê-los.

Porém, recebendo salários miseráveis, só irão em locais cujas pessoas são do mesmo nível ou seja, só prenderão os pobres, os pretos e as p...

Qual o político que, honestamente, declararia que a razão de não haver inamovibilidade para os policiais é para que estes possam ser ameaçados de transferência para o interior se não fizerem alguma ilegalidade ou atenderem os expressos interesses deles.

Ora, a Segurança Pública no Brasil é uma farsa, um engodo, uma fraude.

As estatísticas servem, única e exclusivamente para camuflarem a realidade e calarem os repórteres e os meios noticiosos.

Quantos foram assassinados no ano passado?

Quantos foram roubados, estupradas ou furtados?

Quem vai dizer para a população: “Ninguém sabe”.

Não existe qualquer controle.

Os números são apostos nos mapas estatísticos conforme a vontade do governante da época.

Se a verdade vier à tona, se o público souber da realidade, o responsável pela estatística será substituído, transferido ou de alguma forma punido.

Chega.

Depois de 170 anos a Polícia deve gritar pela verdade.

A Força Policial agora sem mordaça quer dizer aos quatro cantos deste país: “nós também somos brasileiros, nós acreditamos no povo, nós somos o povo, nós existimos para servir e proteger o povo”.

Não somos serviçais dos governos, somos funcionários do Estado, empregados do povo.

Não somos responsáveis pelo aumento dos índices de criminalidade.

Eles aumentam porque não participamos das políticas de Segurança Pública, de Desenvolvimento, de Emprego , de Renda, de Serviços, de Educação, de Meio Ambiente, de Trânsito...

E sabem porquê?

Porque se nós participarmos, não se poderá desviar verbas na compra de armamentos, viaturas que não passam nos testes de qualidade, de comunicações, de sistemas de informática, de construções inadequadas, de formação deficiente.....

Não vão mais poder camuflar os índices de criminalidade.

Não vão poder mais proteger seus parentes e apaniguados que cometem crimes.

Todos terão direito à segurança.

Nós não queremos mais que a população sofra, da mesma forma que não queremos mais ser responsabilizados pelo erro de outros.

...

Léo Gonsaga Medeiros – Cel PM RR e Paulo Magalhães Araujo – Delegado MS

*O presente artigo foi escrito originalmente em 15 de janeiro de 2002 e atualizado em 26 janeiro de 2007.


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