O problema jurídico do Brasil não é a falta de leis – que já temos em excesso – mas a falta de bom senso na interpretação de cada uma delas. Um exemplo típico ocorreu na primeira partida das semifinais do Campeonato Paulista de 2009, entre Corinthians e São Paulo, duas das equipes mais tradicionais do país. Ao fazer o gol da vitória da equipe do Parque São Jorge, aos 48 minutos do segundo tempo, já nos acréscimos, o jogador Christian correu para a torcida adversária e fez gestos que foram considerados obscenos.

Um promotor de Justiça resolveu levar o caso à Polícia e pediu a abertura de inquérito contra o jogador. O que poderia ser resolvido na esfera da justiça esportiva acabou sendo transformado – pasmem! – em um caso de polícia, como se a polícia não tivesse nada mais importante a fazer.

O leitor já experimentou ir a uma delegacia registrar queixa? Muitas vezes são horas de espera, diante da quantidade cada vez maior de delitos como furto, roubo, seqüestros relâmpagos e agressões. Não raro a viatura chega com atraso ao local do crime por excesso de demanda.

Convenhamos, nesta realidade dá para acreditar que será elaborado um inquérito policial, deixando outros casos muito mais importantes para trás, para punir um jogador por gestos obscenos no calor de um jogo decisivo? Não se trata de defender o atleta. É evidente que ele agiu de forma inoportuna, errou, e deve ser julgado. Em casos semelhantes, a Justiça Esportiva condena a até 10 jogos de suspensão. Para Christian, a maior pena seria ficar fora das finais em mais duas partidas decisivas, contra o Santos Futebol Clube, já que o São Paulo foi eliminado na segunda partida. Ser condenado na esfera criminal, ainda que receba pena mínima, soará como ridículo, ainda mais num país onde grandes crimes permanecem impunes.

Está mais que na hora de a imprensa deixar de promover exibicionismos de algumas autoridades e de valorizar o que realmente temos feito de bom. Talvez seja o caso de elaborar apenas mais uma lei:

“É proibido não ter bom senso na interpretação das leis. Revogam-se as disposições em contrário”...

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*Sérgio Rubens, ex-subsecretário de Justiça e Defesa da Cidadania do Estado de Mato Grosso

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