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TEMA LIVRE : Antonio Copriva

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Lépidos Édipos
09/03/2005

Em “A Insustentável Leveza do Ser”, o escritor checo Milan Kundera faz uma evocação da tragédia grega Édipo, de Sófocles, escrita cerca de cinco séculos antes de Cristo. Ele trabalha com metáforas delicadas e traça paralelos com a invasão de seu país pela então União Soviética, e sugere que as desculpas por atos criminosos alegando ignorância e desconhecimento da extensão e do alcance das ações perpetradas não possuíam consistência.

Assim o escritor resume a história do rei de Tebas: “A história de Édipo é bem conhecida: um pastor, tendo encontrado um recém-nascido abandonado, levou-o ao rei Pólibo, que o criou. Quando Édipo cresceu, encontrou num caminho das montanhas um carro em que viajava um príncipe desconhecido. Os dois se desentenderam, e Édipo matou o príncipe. Mais tarde casou com a rainha Jocasta e tornou-se rei de Tebas. Não suspeitava que o homem que tempos atrás assassinara nas montanhas era seu pai, e que a mulher com quem dormia era sua mãe. Enquanto isso a sorte perseguia seus súditos, dizimando-os com doenças. Quando Édipo compreendeu que era o único culpado por esses sofrimentos, furou os olhos com espinhos e, cego para sempre, partiu de Tebas”. Pouco mais adiante, o romancista reafirma: “Édipo não sabia que dormia com sua própria mãe, e, no entanto, quando compreendeu o que tinha acontecido, nem por isso se sentiu inocente. Não pôde suportar a visão da infelicidade provocada por sua ignorância, furou os olhos e, cego para sempre, partiu de Tebas”. Sim, não se fazem mais Édipos como antigamente...

A sociedade consumista, regida pelo capitalismo selvagem que impõe o reinado do ter sobre o ser, produz anomalias que circulam disfarçadas de estruturas fashion pelos corredores dos shoppings, supremo arquétipo da concentração de desejos e frustrações que as contradições da cultura de massas não consegue, não deseja e não tem estrutura para resolver. No próprio ventre da “revolução” é gerada a metástase que a condena ao sacrifício diário do aumento das desigualdades sociais, das exclusões, hipocritamente maquiadas em alegorias de ecstasy e na alienação de jogos eletrônicos, numa disseminação de um tipo de ideologia que serve para cristalizar um status quo mas que, ao mesmo tempo, conduz ao isolamento, ao cárcere com algemas de seda e ao pavor de todos os sons que vêm da rua, território minado sob o domínio dos outros.

Dentro dessa estrutura se movimentam as pobres criaturas que sentem necessidade de conseguir aquele mundo quimérico que mostram as propagandas dos bancos, que aparecem nos ideários das montadores de automóveis, nos comerciais ilusionistas dos supermercados, de magazines e butiques, em contraposição com os aumentos de salários de deputados, os crimes impunes de autoridades, os desmandos do crime organizado, a atuação morosa dos esquemas de segurança e a falência visceral do sistema de saúde, para não citar a educação entregue aos vendilhões do templo e sua máquina de xerocar diplomas.

Expostos aos efeitos desses “tsunamis” (pra usar uma palavra da moda) mercantilistas disfarçados de ideologia e edulcorados como objetivos de vida, vamos ter conhecimento de jovens que roubam jóias e caros equipamentos eletrônicos de pais, mães, irmãos, tios, primos, avôs e avós para vender no mercado paralelo (pelo qual terminam sendo absorvidos, monitorados por empresários muy amigos) e acompanhar a onda dos amigos mais abonados, ou que também usam os mesmos expedientes para se mostrar diante da sociedade. O capitalismo selvagem elege o lucro como seu deus, o resto é apenas figuração, os fins sempre justificam os meios. Sobrinhas e sobrinhos se apossam de cartões de créditos de tios e tias incautos, que ingenuamente solicitam ajuda para pagamentos de algumas contas, e financiam noitadas em bares, boates, compras em butiques e viagens glamurosas. Quem dita as regras? O importante é ter, não ser. Filhos aproveitam os sons das harpas edipianas para se deixarem seduzir por golpistas profissionais e espertalhões eternamente de plantão, avançando sobre poupanças duramente amealhadas, conseguindo prazeres efêmeros junto a companhias descartáveis, figurantes de aluguel incentivando a discórdia, a rapina, a delinqüência. Essa desagregação não tem retorno e quem não a vive ou viveu, fatalmente viverá ou estará bem próximo de algum exemplo.

A maldição de Laio, rei de Tebas, certamente estará tendo repercussão até nossos dias.

O poeta Eduardo Alves Costa escreveu, de certa feita, um longo poema denominado “No Caminho, com Maiakovski”, do qual reproduzo uma parte que servirá como fecho e mote para este artigo. E quer dizer que é preciso agir, ou sucumbiremos como muares, mudos e ruminantes:

Na primeira noite, eles se aproximam
E colhem uma flor do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
Pisam as flores, matam o nosso cão.
E não dizemos nada.
Até que um dia o mais frágil deles
Entra sozinho em nossa casa,
Rouba-nos a luz e, conhecendo o nosso medo, Arranca-nos a voz da garganta.
E, porque não dissemos nada,
Já não podemos dizer nada.

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