capa | atento olhar | busca | de última! | dia-a-dia | entrevista | falooouu
guia oficial do puxa-saco | hoje na história | loterias | mamãe, óia eu aqui | mt cards
poemas & sonetos | releitura | sabor da terra | sbornianews | vi@ email
 
Cuiabá MT, 24/11/2024
comTEXTO | críticas construtivas | curto & grosso | o outro lado da notícia | tá ligado? | tema livre 30.947.628 pageviews  

Tema Livre Só pra quem tem opinião. E “güenta” o tranco

TEMA LIVRE : Xico Graziano

Outras colunas do Tema Livre

Safra no carnaval
04/03/2014

Fala-se, no Brasil, que as coisas começam a funcionar, mesmo, somente depois do carnaval. Na economia, na política, na educação, leva-se tudo em banho-maria até o desfilar da escola de samba. Quando entra a quaresma, aí, sim, vem a pauleira.

Tal preceito, porém, vale somente na cidade. Porque no campo o ritmo é diferente. Os agricultores entram no ano novo trabalhando a mil na safra. Outra folia.

Nesta altura de fevereiro/março, quando a turma da cidade se enfeita para curtir as últimas horas da grande bagunça carnavalesca, a turma da roça está com seus tratores zunindo na lavoura. Na avenida, hora da diversão; na terra, momento da colheita. Para aqueles, alegria na dança; para estes, festa no paiol. Curioso é perceber essa diferença de timing entre o campo e a cidade.

No passado não muito distante, maior ainda era a distância entre os dois mundos. Hoje em dia, progressivamente se aproximam.

Primeiro, por causa do enorme êxodo populacional que esvaziou um e inchou o outro. Segundo, porque o campo está sendo "urbanizado" -- estradas de asfalto, telefonia, transporte coletivo, internet, melhorias que reduzem as distâncias socioculturais. Terceiro, graças à integração produtiva que interligou a produção rural, dentro da fazenda, e a economia urbana.

Antes os agricultores moravam na sede da colônia, hoje a maioria reside na cidade. Idem no caso dos trabalhadores rurais.

Mesmo considerando a moderna agroindustrialização, que de certo modo embaralha as atividades rurais com as urbanas, preservam-se algumas características únicas.

Uma delas é a intensificação do trabalho em função da sazonalidade da produção agrícola. Existem períodos determinados de plantio, crescimento vegetal, florescimento e colheita dos grãos, sequência natural que determina um afã próprio.

Na criação de animais, do acasalamento ao bezerro, do pintinho ao frango, do porquinho ao pernil, há que aguardar a hora da recompensa.

Na urbe, diferentemente, o trabalho humano desenrola-se com maior uniformidade, seja nas linhas de montagem industrial, seja nos balcões do comércio.

Parafusos, ou roupas, fabricam-se e vendem-se todos os dias, faça chuva ou sol. Arroz ou feijão dependem do clima para vingar.

Mesmo quem labuta por conta própria escolhe o momento de se ocupar. No campo, o labor conecta-se ao ciclo da natureza. E nesta época de carnaval aumenta o suadouro, pois as lavouras entram na sua fase final. Dureza.

O avanço tecnológico tem modificado o ritmo de vida do agricultor. No tempo de nossos avós havia apenas uma safra por ano.

Os cereais, ou o algodão, eram plantados no início das chuvas, logo na entrada da primavera, quando o tempo esquentava. Entre março e abril realizava-se a colheita.

Porém, desde que o melhoramento genético começou a se impor e a mecanização avançou, surgiram novas variedades, com ciclos de produção mais curtos, algumas precoces e outras tardias, adaptadas regionalmente.

Métodos de cultivo desenvolveram-se, como o plantio direto, que executa a semeadura dispensando a aração e a gradeação dos terrenos, economizando tempo.

A dissecação química, utilizada especialmente na lavoura de soja, seca rapidamente as plantas, adiantando a colheita.

Fruto dessa evolução agronômica, os produtores passaram a ter duas e, dependendo de irrigação, até três safras anuais.

Variadas são as combinações produtivas, que alternam as culturas e permitem elevar o rendimento da terra, melhor remunerando o capital agrário. Mais complexa, assim, se torna a atividade agropecuária.

Impulsionada pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e por órgãos estaduais de pesquisa, juntamente com as cooperativas, de forma crescente se avança também na integração lavoura-pecuária, sistema em que, após a colheita do grão, entra o pastoreio do gado.

A boiada alimenta-se das sobras da lavoura, misturadas com o capim, que viça fertilizado pelo adubo remanescente no terreno. E o esterco animal eleva a matéria orgânica do solo. É incrível.

Esse fascinante mundo rural vibra num diapasão distinto da bateria das escolas de samba. Ambos aceleram as canelas nesta época do ano.

Mas enquanto os foliões varam a madrugada se divertindo, os produtores rurais cedo dormem o sono profundo, acordando com as galinhas para trabalharem duro na poeira da roça.

Mal conseguem, os agricultores, assistir na televisão ao desfile carnavalesco, ver as beldades e sua coreografia maravilhosa. Mesmo curiosa, a pálpebra do fazendeiro teima em fechar pelo cansaço do corpo.

Se os dois eventos pudessem ser comparados - o carnaval e a colheita da safra -, ambos os espetáculos impressionariam um júri especial isento de paixões.

Nenhum povo vive sem alegria e os brasileiros transformam o grito de carnaval num momento extraordinário de liberação da energia positiva, dançando, bebericando, paquerando, esbaldando-se até exageradamente.

Afora os excessos, a festa promove um encontro bizarro da modernidade com as raízes populares.

Por outro lado, nenhuma nação sobrevive sem o árduo trabalho dos produtores rurais, que retiram da terra o sustento do povo, oferecem emprego aos mais simples, zelam pela paisagem campestre, protegem os valores históricos. Por isso se assemelham, quanto à sua importância, as festas da avenida e do campo.

Embora na arquibancada sobrem aplausos para o desfile, enquanto anonimamente se executa o trabalho rural, ambos são gratificantes.

Marotos, os agricultores sabem que sem o alimento que produzem ninguém teria energia para enfrentar o carnaval.

Nem cachaça ou cerveja existiriam. Uma precisa da cana-de-açúcar, a outra vem do cereal.

Palmas para os produtores rurais, que sambam, e suam, na colheita da safra.


...

*AGRÔNOMO, FOI SECRETÁRIO DE AGRICULTURA E SECRETÁRIO DO MEIO AMBIENTE DO ESTADO DE SÃO PAULO. E-MAIL: XICOGRAZIANO@TERRA.COM.BR


OUTRAS COLUNAS
André Pozetti
Antonio Copriva
Antonio de Souza
Archimedes Lima Neto
Cecília Capparelli
César Miranda
Chaparral
Coluna do Arquimedes
Coluna do Bebeto
EDITORIAL DO ESTADÃO
Edson Miranda*
Eduardo Mahon
Fausto Matto Grosso
Gabriel Novis Neves
Gilda Balbino
Haroldo Assunção
Ivy Menon
João Vieira
Kamarada Mederovsk
Kamil Hussein Fares
Kleber Lima
Léo Medeiros
Leonardo Boff
Luciano Jóia
Lúcio Flávio Pinto
Luzinete Mª Figueiredo da Silva
Marcelo Alonso Lemes
Maria Amélia Chaves*
Marli Gonçalves
Montezuma Cruz
Paulo Corrêa de Oliveira
Pedro Novis Neves
Pedro Paulo Lomba
Pedro Pedrossian
Portugal & Arredores
Pra Seu Governo
Roberto Boaventura da Silva Sá
Rodrigo Monteiro
Ronaldo de Castro
Rozeno Costa
Sebastião Carlos Gomes de Carvalho
Serafim Praia Grande
Sérgio Luiz Fernandes
Sérgio Rubens da Silva
Sérgio Rubens da Silva
Talvani Guedes da Fonseca
Trovas apostólicas
Valéria Del Cueto
Wagner Malheiros
Xico Graziano

  

Compartilhe: twitter delicious Windows Live MySpace facebook Google digg

  Textos anteriores
26/12/2020 - MARLI (Marli Gonçalves)
21/12/2020 - ARQUIMEDES (Coluna do Arquimedes)
20/12/2020 - IDH E FELICIDADE, NADA A COMEMORAR (Fausto Matto Grosso)
19/12/2020 - 2021, O ANO QUE TANTO DESEJAMOS (Marli Gonçalves)
28/11/2020 - OS MEDOS DE DEZEMBRO (Marli Gonçalves)
26/11/2020 - O voto e o veto (Valéria Del Cueto)
23/11/2020 - Exemplo aos vizinhos (Coluna do Arquimedes)
22/11/2020 - REVENDO O FUTURO (Fausto Matto Grosso)
21/11/2020 - A INCRÍVEL MARCHA DA INSENSATEZ (Marli Gonçalves)
15/11/2020 - A hora da onça (Coluna do Arquimedes)
14/11/2020 - O PAÍS PRECISA DE VOCÊ. E É AGORA (Marli Gonçalves)
11/11/2020 - Ocaso e o caso (Valéria Del Cueto)
09/11/2020 - Onde anda a decência? (Coluna do Arquimedes)
07/11/2020 - Se os carros falassem (Marli Gonçalves)
05/11/2020 - CÂMARAS MUNICIPAIS REPUBLICANAS (Fausto Matto Grosso)
02/11/2020 - Emburrecendo a juventude! (Coluna do Arquimedes)
31/10/2020 - MARLI (Marli Gonçalves)
31/10/2020 - As nossas reais alucinações (Marli Gonçalves)
31/10/2020 - PREFEITOS: GERENTES OU LÍDERES? (Fausto Matto Grosso)
26/10/2020 - Vote Merecimento! (Coluna do Arquimedes)

Listar todos os textos
 
Editor: Marcos Antonio Moreira
Diretora Executiva: Kelen Marques