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Cuiabá MT, 24/09/2024
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Curto&Grosso O que ainda será manchete

comTEXTO : Acerto de Contas

OUTRAS PUBLICAÇÕES
31 de Março, 1964
Acerto de Contas
Representação fictícia de fatos reais
21/08/2005- Talvani Guedes da Fonseca



CAPÍTULO CCXXXIII

Era engraçado como Isabel conseguia trazer coisas distantes...

...Ele lembrou que a Rússia era um país atrasadíssimo e, no entanto, foi lá que se deu a primeira experiência socialista...

...¨Marx dizia que na sua primeira fase, no seu primeiro estágio, o comunismo não pode, economicamente, estar em plena maturação, completamente libertado das tradições ou dos vestígios do capitalismo, continuará por um tempo, como ele diz, prisioneiro do estreito horizonte do direito burguês Se chegarem ao poder, com um programa mínimo os trabalhadores organizados num partido forte e majoritário poderão, aos poucos, arrancar o capital das mãos da burguesia, até que se centralize nas mãos do Estado todos os investimentos de produção. Isto pode acontecer em qualquer país. O importante é saber que apenas conseguir concessões da classe capitalista não mudará as condições básicas da exploração. Tudo isto que estou falando está no Manifesto, que li aos 15 anos de idade. Marx deixou uma espécie de cartilha e, assim, ao tomar o poder, a classe trabalhadora, qualquer uma, de qualquer país, se for realmente revolucionária, e não apenas reformista, como é a tendência da esquerda, deverá seguir os passos recomendados no Manifesto e ir direto ao encontro do marxismo e ao socialismo, contra todos os velhos e reacionários partidos, com um programa mínimo, porém claro, que inclua o confisco de todas propriedades, expropriação do latifúndio e emprego da renda obtida no custeio de despesas públicas; centralização do crédito, nas mãos do Estado, e instituição de pesados impostos, progressivo, além da abolição do direito de herança; de acordo com um plano coletivo, partir para multiplicar as fábricas e indústrias nacionais, estabelecendo a obrigatoriedade do trabalho para todos; unificar a exploração da agricultura e da indústria; instituir a educação pública gratuita...

...¨Caramba! Tienes un programa completo de gobierno!¨...

...¨Não, meu amor, não tenho um programa de governo, está escrito no Manifesto Comunista, de 1848, e a estúpida e pequeno-burguesa esquerda, comodista e para sempre enferma, sempre chegando atrasada, prefere ignorar. Aliás, este programa, como você preferiu chamar, já acontece em Cuba, porém, o comunismo, um coletivismo sem divisão de classes, com tudo comum a todos, numa sociedade sem classes, radicalmente nova, talvez seja visto, quem sabe, como a volta ao éden, ainda não existe. Quando for destruído o sistema capitalista, abolidas e destruídas as formas de governo, aí, sim, chegaremos muito além do socialismo e do comunismo, ao anarquismo puro de Prodhon e Kropótkin, contemporâneos de Marx que pregavam a unificação dos povos do mundo a partir da inexistência de classes. O capitalismo é incapaz de resolver os problemas da humanidade! A economia não será planejada como agora, com tanta rigidez, onde o partido é quem determina onde cada um deve viver, trabalhar e quanto produzir. Visto como se pratica na URSS, o comunismo é coisa de outro mundo, é uma religião de Estado que se fundamenta em dons e na fé nos dirigentes. Se não o é, ainda, no futuro o comunismo será uma lição de vida, como se tentou criar no século 19. Não precisamos ler Marx para saber que o sistema econômico é quem determina como as pessoas vivem e devem viver. O socialismo que hoje existe é resultado de circunstâncias bem específicas, assim como será o futuro do próprio socialismo, que nunca morrerá nem deixará de existir! O que sei, Isabel, é que somente o comunismo suprimirá em absoluto a necessidade do Estado, porque não haverá ninguém a quem reprimir. E aí, viva a felicidade!¨...

...¨Ouve-me¨, falou Isabel, ¨ainda que não creia no que tu crês, muito me impressionam as histórias de homens que deram a vida pelo comunismo, como Che, por exemplo. Sempre observei o comunismo de longe, porque sei que é materialista. Me explica isso, por favor, e fala porque o capitalismo é tão mau¨...



CAPÍTULO CCXXXIV

...Abraçada à almofada lilás, a preferida, apertando-a contra a face, com a expressão atenta, Isabel mais parecia uma dedicada aluna, dizendo-lhe para continuar...

...¨Matéria vem de mater, mãe, e em latim traduz é traduzida do grego hyle, que quer dizer floresta, madeira e fecundidade e madeira é tradução portuguesa de matéria. Marx rejeitou a precedência da matéria ao espírito, preocupou-se antes de mais nada, com as graves questões sociais, não com a filosofia, a metafísica. O materialismo marxista é uma concepção explicativa da História e diz que fundamentalmente não são as idéias que governam o mundo; as idéias é que dependem das condições econômicas da sociedade, e assim da própria matéria. Se a economia engloba o conjunto dos esforços do homem, ela, a economia, constitui a estrutura essencial das relações sociais.Tudo é matéria, Isabel. Porque no capitalismo as empresas e o governo exercem controle sobre a economia, a política, a sociedade e a cultura, sempre em favor do capital, o capitalismo é direto, perverso, é preciso que se consuma mais para que se produza mais, ao contrário do que deveria ser, nele as pessoas só se importam com o presente, e o presente é consumo, entretanto, a maior parte da sociedade não tem acesso aos bens de consumo ou a uma vida digna. A voracidade capitalista independe de qual seja a necessidade de consumir, porque consumir é a forma exclusiva de felicidade, ainda que obtidas graças à indolência, servilismo e ignorância do semelhante¨...

...Como se tivesse se perdido no raciocínio, parou de falar...

Isabel insistiu...

...¨Siga, por favor¨...

...¨Nos interesses capitalistas tudo se mistura, até d(eu)s. Ninguém sabe mais se é cidadão ou consumidor, a sociedade está dividida em faixas. A mãe do capitalismo moderno é a televisão, essa reprodutora de delinqüência e deformadora de consciências, que diz como as pessoas devem ser. Ela prende a todos, hipnotiza as pessoas. Veja essa série que está passando em rede nacional, Dallas. O Brasil todo está preocupado com um tal de JR, inclusive a mesa lá do Djalma! É duro ver nossa inteligência ser fisgada por uma máquina. O intelectual brasileiro, ao invés de se preocupar com as questões fundamentais do país, está preso às novelas. Quem não vê Água Viva, um folhetim que trata das angústia da burguesia carioca? E Raízes? O Brasil chorou em coro, pelo sofrimento de Kunta Kinte, na mini-série sobre o avô do escritor Alex Hailey. A televisão, que foi criada para veicular padrões de comportamento, com a história de um negro americano, despertou entre nós, pelo menos momentaneamente, o sentimento afro. Não foi com Zumbi nem Ganga Zumba. Criada para vender as vantagens de um mundo lucrativo, para defender, controlar e comandar a ideologia do consumo, a televisão não vê o indivíduo como ser humano, vê classes sociais, alvos. Cada mensagem que envia tem a finalidade de padronizar, tornar regular e lucrativo o consumo. Será que o ser humano produzirá a própria extinção pela fome, sede? O verbo consumir é sinônimo de capitalismo, nos faz sentir como se fôssemos vermes que a tudo devoram. Veja as nossas cidades, estão à serviço do carro! Bairros históricos de muitas cidades são demolidos para que o carro possa passar. Não porque querem deixá-las mais bonitas, limpas, estão matando a memória das nossas cidades. Isso acontece em São Paulo, Natal, Salvador, Manaus. Áreas inteiras centrais do Rio de Janeiro, como a Lapa, cedem lugar a largas e novas avenidas, o pior é o que fazem com o povo. Quando eu morava no Rio, derrubaram a favela da Praia do Pinto, no Leblom, para afastar para fora da cidade, lá para a Zona Oeste, na chamada Cidade de d(eu)s, uma população inteira de profissionais pobres, empregadas domésticas, mecânicos, cobradores de ônibus, vendedores de chá mate, motoristas, arrumadeiras, famílias que há décadas viviam ali. E eu soube que estão fazendo a mesma coisa no Recife, com a favela do Coque, ao lado da praia de Boa Viagem. A repulsa pela pobreza é fatal, além de tomar-lhes o espaço para construir prédios, escorraçam-nos para longe. Por quê? Pobre não tem direito a banho de mar? O livre desenvolvimento de cada um é condição básica para o livre desenvolvimento de todos. Um dia, a burguesia vai acordar e encontrar multidões tomando banho de mar, sujando suas lindas areias e, para variar, assaltando quem passar. Por quê não se resolve de uma vez o problema da miséria?¨...

...¨En todo el mundo todo está acontecendo eso¨...



CAPÍTULO CCXXXV

¨Ao invés de gastar dinheiro com grandes obras, que, logo serão obsoletas, por quê não dão escola, trabalho e saúde ao povo? Ora, porque o povo termina acordando e adquirindo a consciência de que é preciso acabar com a burguesia, com o sistema capitalista. Fazem as grandes obras para roubar o dinheiro do Estado, que é do povo. Você já viu coisa mais inútil e horrorosa do que o Minhocão que o turco ladrão, um corrupto guindado ao poder pelos militares, construiu para resolver problemas de trânsito no centro de São Paulo? Falei turco sem preconceito, maneira de dizer, porque ele é filho de libaneses e sabe muito bem que não adianta resolver os problemas de trânsito, porque a meta da indústria automobilística é vender mais, sempre mais; como também sabe que a obra pública é sempre uma oportunidade de sobrar dinheiro, que não é feita para garantir empregos aos trabalhadores que as erguem, e sim para alguns poucos ganhar mais. Qual é o maior anunciante da televisão? O carro, a indústria automobilística. Escrevi tudo isso. Publiquei em 1975. Alguém leu? Adiantou? Não, porque só se pensava numa coisa, em derrubar o alemão, o que deixaria o governo americano feliz e, por tabela, a indústria automobilística¨...

...¨Não entendi uma coisa, televisão e capitalismo são a mesma coisa?¨...

...¨Para nós, ocidentais, claro que sim. O mundo é o que a publicidade acreditar que é, e a droga eletrônica, a televisão, pela saturação pode vender qualquer produto, passa o tempo todo dizendo que qualquer um pode ser milionário e, de repente, a gente trabalha não para viver, para ser consumidor! Cada vez precisa ganhar mais, para consumir mais, e nesse processo de consumo a publicidade e a televisão são engrenagens científicas, desumanitárias, encarregadas de padronizar nossos hábitos, inclusive alimentares, porque o alimento virou um produto como qualquer outro produto industrial. O frango que a gente come é tratado com antibióticos e o boi, e o porco, então, prefiro nem pensar nisso! Pelo bem da saúde? Qual nada! Para dar mais lucro e facilitar e acelerar o consumo. Viover não é mais o objetivo, o sentido da vida. O lucro é quem manda em tudo, Isabel. O capitalismo é cínico, fatura tudo, até o medo. Nele, você é o que faz ou o que pode comprar. A hipocrisia é tanta, que inventaram o seguro de vida, essa mercadoria feita de medo e temor. A publicidade nada mais é do que uma fábrica de sonhos, estimuladora de cobiça e luxúria. Que me perdoem meus amigos publicitários, mas alguns deles sabem que são pagos para mentir, e outros vão até mais longe, acreditam mesmo que o produto é o que menos interessa, sim a forma de como vendê-lo; eles que me perdoem, mas, sabem que vendem a própria inteligência em nome do aumento do consumo; me perdoem pelo esforço diário de tentar persuadir e fazer que ninguém perceba que está pagando mais caro¨...

...¨Você já fez publicidade?¨...

...¨Sou jornalista, Isabel. Já me imaginou, fazendo de tudo para não perder um cliente, ou paciente, ou doente mesmo, pois quem consume sem precisar, padece de enfermidade? Não dá, meu amor! Eu nunca enganaria ninguém com anúncios que são pura fascinação, forçando as pessoas a comprar coisas que estão acima de suas possibilidade, a melhor televisão, o melhor carro! Tem coisa mais ridícula do que as cortesias e a amostra grátis, criadas pela publicidade, para empurrar mentira e negócios duvidosos? A razão fundamental de qualquer produto à venda é o lucro, não é servir; imbute-se de tudo para o lucro ser maior. Você compra um produto, uma frigideira de fritar batatas, começa a usá-la e depois das primeiras vezes, o cabo da cesta de arame, onde ficam as batatas, fritando-as, fica mole, vai indo, vai indo e, pum, quebra! Por quê? Ora, porque, para o lucro ser maior, usaram matéria-prima de Segunda categoria. Mamãe está com esse problema, agora, lá em casa. Ela está puta da vida! Mas, é assim, com todo o tipo de coisa que se compra. A regra não é lucrar o máximo possível? Então, vale tudo. Por exemplo, todo mundo sabe que essa coisa de amostra grátis é um blefe, que tudo tem um custo, nada é grátis. Todo produto tem seu custo e precisa ser vendido, tem como objetivo específico, dar lucro, e até a morte tem que dar lucro, porque, se a analisarmos como indústria, veremos como a violência é usada para incrementar a economia. Se permitem que se mate em legítima defesa, é ético não apenas fabricar armas, como, principalmente, lucrar com elas, cujo ato de perfeição maior é tirar a vida do semelhante. Na paz ou na guerra, exatamente por inventar guerras que matam e lucrar com a morte, a indústria bélica é coercitiva. A cultura capitalista foi montada e programada para que não se pense em felicidade, só em consumir, e é esta a razão de ser da publicidade, alimentar nas pessoas o desejo de comprar porcarias que não precisam e despertar, à base da repetição, da saturação, a ânsia de consumir. A publicidade não se importa se vende refrigerante ou avião de guerra, tanto faz. Chegamos a um ponto tal que, sem anunciar, é impossível vender ou comprar qualquer coisa¨...

...¨Yo no soy consumista!¨...

...Sem querer, e sem saber, todo mundo é, Isabel. A gente mal entra no supermercado e determinados produtos pulam dentro do carrinho de compras, como se todos nós soubéssemos o que lava mais branco, a melhor cerveja... Por quê? Ora, porque a publicidade nos ´conquista´ apelando para a motivação e ao emocional A gente não nota que dentro da nossa própria casa, somos bombardeados diariamente com milhares de mensagens, imagens cuidadosa, feitas com fortes argumentos, elaborados para enaltecer o supérfluo e que têm como finalidade incitar a nossa imaginação para forçar-nos a consumir o que não é essencial, coisas que na maioria das vezes não precisamos. São métodos infalíveis, para explorar nossa boa vontade e ingenuidade, um jogo em que vale tudo. Para tornar verdadeiras as mentiras que anuncia, a publicidade não poupa despesas, gasta verdadeiras fortunas para vender, não se importando se encarece muito ou pouco o produto que é anunciado; para vender qualquer arma vale, até a sexualidade, uma coisa sagrada que, como apelo, para seduzir, é confundida com pornografia. Minha mãe queixou-se, outro dia... Essa gente que faz os reclames só pensa em sexo! E quando a nudez não servir mais para vender, como é que vai ser? Inventarão o quê? No setor de medicamentos, então, o sistema é ainda mais cruel. Dezenas de epidemias mortíferas matam, todos os anos, milhões de pessoas. Tinha razão Francis Bacon ao dizer em suas críticas aos métodos de dedução escolástica, e isso, no século XVII, que saber é poder. É ultrajante! Saúde é mercadoria, tem preço, o que faz com que desapareça a própria grandeza da medicina. Quem não tiver plano de saúde, não terá saúde e enquanto isso os laboratórios detém o saber, para manter a medicina refém nem para curar, para aumentar o capital e o lucro do acionista, usando as populações pobres como cobaias, em experiências perigosas, e, quando descobrem uma cura, essa tecnologia, que poderia salvar milhares ou milhões de vidas, é vendida a preços exorbitantes. A tecnologia e a ciência deveriam ser patrimônio da humanidade, serem usadas para beneficiar as populações...

...¨Dejame decirte, por favor¨, e Isabel pediu uma parte, questão de ordem, para contar que um professor dela dizia, nos tempos de ginásio, que o diabo inventou a publicidade...

...¨El diablo, en forma de serpentee, dijo a Eva que si ella comiera el fruto del árbol de la sabedoria, conocería al bien y el mal y de esa manera, vendió su produto¨...



CAPÍTULO CCXXXVI

¨Está vendo? Até d(eu)s foi derrotado pela publicidade, essa criação demoníaca. No caso dos remédios, por exemplo, as vítimas nunca são os ricos, sim as populações carentes, sem recursos para pagar e, como na indústria bélica, que mata mais rápido, as vendas não caem nunca! Que me perdoem os que juram, juraram e jurarão corretamente sobre o testamento de Hipócrates. Em muitos casos os interesses econômicos são postos acima da vida das pessoas e, se não houver dinheiro na jogada, aí é que a medicina não salva. Há muito, desde que os laboratórios mercantilizaram a medicina para as massas, as relações entre médico paciente se faz em cifras, e todo mundo sabe que, em sua grande maioria, os médicos agem como homens de negócios, na maioria das vezes são meros vendedores de remédios, presos à triste lógica da indústria farmacêutica, a dor e a doença que dão lucros. A medicina é parte de um dos negócios mais lucrativos do mundo, e só perde para os bancos, que vendem a mais fantástica e mais cara de todas as mercadorias, o dinheiro; quem gosta de dinheiro, nunca fica satisfeito, nunca se farta com a renda. Quando eu era menino e me perguntavam o que eu queria ser, quando crescesse, eu dizia, quero ser médico. Por quê? Um tio me dizia que só com medicina se fica rico. Com o passar dos anos, entendi melhor e não gostei nenhum pouco de saber que quem enriquece os médicos é o sofrimento humano, e muitos, para complementam suas receitas, recebem comissões da indústria farmacêutica, para forjar e criar mercados para os produtos novos, de uma indústria que não está nem aí, se piora ou não a qualidade de vida, porque é a doença que importa, é ela é que dá lucro. É a mesma coisa que aconteceu com o açúcar refinado, que introduziu na humanidade males que até o Século XV não se conhecia, e continua fazendo mal, da mesma forma que o cigarro faz mal, sabe-se que o alcoolismo é uma doença, ou o levedo da cerveja que, em doses contínuas, só prejudica a saúde, e no entanto, aí está a propaganda, caríssima, induzindo a massa a adoecer. Por quê? Porque são produtos sobrecarregados de impostos, que dão excelentes lucros ao Estado. Gasta-se mais para matar do que para salvar; ninguém quer ver o que salta aos olhos, que as pessoas adoecem cada vez mais cedo e se um cientista pesquisa uma vacina nova, contra um mal qualquer, o faz não para que o rico acionista não seja atingido por alguma peste, para que ele tenha lucro. É tudo muito hipócrita, além de irônico! Fantasia é uma das coisas que o capitalismo mais vende, veja as indústrias do cinema, moda e cosméticos, que lucram só com a fantasia, e esta última, então, que promete tornar qualquer mulher bonita, insinua que quem usa seus produtos pode perpetuar a juventude. A indústria da moda acabou com a individualidade na vestimenta, e, no fim, é tudo hipocrisia! As revistas americanas publicam fotos de modelos negras não porque são belas ou porque o preconceito diminuiu porque existe um mercado de pessoas negras, as pessoas negras são exatamente as que mais sabem o quanto black is beautiful...

...¨Mira! Yo no soy negra, pero te veo bellísimo! Gracias!¨...

...¨Eu falava de outra coisa, a hipocrisia. Veja, a indústria do sangue, que movimenta bilhões de dólares em todo o mundo, depende de um banco, o de sangue! Para enganar o povo o capitalista, diz que propaganda é a alma do negócio; na verdade, é a arma mais constrangedora do negócio, para manipular tudo, e seu d(eu)s é o lucro. A propaganda jamais apela à razão; sempre à emoção, ao instinto, disse Joseph Goebbels, aliás, o “pai” da propaganda; segundo ele, propaganda não diz respeito à verdade em geral, mas à verdade tal como ela é interpretada pelo propagandista”...

...“Não foi ele quem disse que uma mantira repetida continuamente, se transforma em verdade?”...

... “É, foi, amor, que bom que você sabe algo dessa besta! Mas, continuando de onde eu estava, até hoje não sei se mais esquisita das invenções do capitalismo, o chiclete, sobreviveria sem a propaganda! A religião do capitalismo é o dinheiro, um d(eu)s menor, que põe d(eu)s a serviço dos seus interesses. Só não depende deste d(eu)s menor, o dinheiro, quem o tem de sobra. A publicidade comercializa afetos valiosos e descaradamente inventa de tudo para que a humanidade não pare de consumir seja no “dia” dos pais, mães, namorados. Por dinheiro explora-se até a inocência, no dia 12 de outubro, dia em que Cristóvão Colombo chegou à ilha de Espaniola. A publicidade baseia na mentira e na nojeira, a essência do sistema, e tudo não passa de um jogo. Aqui mesmo, em Natal, um candidato que não vale merda, de quatro em quatro anos se elege deputado federal e é o mais votado do Rio Grande do Norte. Por que? Porque o pai foi governador, tem jornal, rádio. A propaganda é um perigo, faz com que o povo, incapaz de reagir, engula o que o patrão quiser¨...



CAPÍTULO CCXXXVII

Demonstrando impaciência e ansiedade, Isabel o interrompeu...

...¨Nem todo patrão é rico, mi padre és patrón e ele passa dificuldades, às vezes nem tem dinheiro para pagar sus peones y demás, falta empleo, la gente necesita trabajar¨...

...¨A falta de trabalho, o desemprego, não é uma questão política. E seu pai está dentro daquilo que a hipocrisia capitalista chama de igualdade de chances, ou seja, fez uma faculdade, se formou e hoje emprega algumas dúzias de peões na construção de estradas. É um pequeno empresário, um construtor; não é um infiel capitalista, propriamente¨...

...¨Gracias! Yo empezaba a preocuparme se ibas asaltarlo!¨...

...¨Ah! Não brinca, Isabel. Me deixa continuar de onde eu estava. Eu falava mesmo de quê? Ah, do publicitário, o vendedor de sonhos e do prazer imediato, que oferece o que ninguém precisa, para produzir mais lucro para os seus clientes. Você já viu, por acaso, a nova onda publicitária, na televisão, para vender um boneco chamado Falcon? Tem nas versões militar, de agente secreto, de mergulhador; enfim, dos heróis americanos, para variar¨...

...¨O que se faz com a imaginação infantil é um crime¨, disse Isabel, ¨a meninada fica maluca!¨...

...¨E alguém ganha um monte de dinheiro com essa porcaria! Há um quarto cheio dessas inutilidades feéricas na casa da minha irmã, um monte de brinquedos idiotas, sem sentido. Um mês depois de comprados não despertam interesse nenhum¨...

...¨Isso é charlatanismo¨, insistiu Isabel...

...¨É o que existe de pior. Joseph Goebells foi o grande mestre no jogo da propaganda, que é, aliás, uma palavra alemã. Ele foi o primeiro grande propagandista, o primeiro grande publicitário da história moderna, ao vender ao mundo um produto enganoso, chamado Adolf Hitler, um negociante da loucura e da fé alemã, além de assassino oportunista. E é por isso é que eu digo que o publicitário é um dos piores serviçais do sistema capitalista. Para tornar o outro incapaz de sentir, ele vende a própria inteligência e, na política, é mais perigoso ainda. A menos que tenhamos uma extraordinária força de vontade, o publicitário poderá nos convencer a comprar o que não precisamos e que mais ninguém, além do patrão dele, tem para vender. É um crime! Pior, porque é praticado sem a permissão da sociedade, e ainda a faz crer na ilusão de que é possível se conseguir todas as coisas pela força bruta ou intimidação. A propaganda nos ensina a consumir sem necessitar, e isso faz com muitos vejam que não só é válido, como é fácil roubar, assaltar ou matar, para se ter, porque, afinal, tudo é supérfluo e descartável na epidemia da superprodução, inclusive, a vida! De forma sutil e filosoficamente, o capitalismo faz tudo o que todas as religiões e o bom senso condenam. Só se dá valor ao que é pago, ao que custa dinheiro. time is money!, tempo é dinheiro. No capitalismo é pecado perder tempo, a vida é totalmente comandada pelo relógio. E há coisas mais absurdas! Por exemplo, tem cabimento pagar a alguém para saber o que fazer, o certo ou o errado? A psiquiatria e a psicanánalise não são isso? A medicina, em si, é boa e útil; infelizmente, virou negócio, hipocrisia pura, um comércio injusto que utiliza a mais sórdida forma de exploração, a dor; o consumo é o capitalismo, Isabel. Quer ver? As matrizes energéticas, que nos dão poder e conforto, um dia acabarão, mas, se o petróleo dá lucro, devemos consumi-lo ainda que, por tratar-se de recurso de origem fóssil, um dia, acabe. Aí, vão achar outra fonte de energia, desde que dê lucro, pois o lucro, em si, explica a destruição do planeta, os desníveis sociais¨...

...¨É bom lembrar que alguém vai pagar o preço, por alterar o equilíbrio¨... lembrou Isabel...

...¨O ser humano deve lutar com a natureza para satisfazer seus desejos, manter e reproduzir a vida desde que esse intercâmbio com a natureza seja regulado racionalmente, como disse o próprio Marx, mas, como se não bastasse a separação do ser humano da natureza, o capitalismo o transforma num ser consumista, ganancioso, como se o planeta fosse uma oportunidade de negócios; e o Planeta Terra é tudo o que temos, o que está em jogo é saber se aprenderemos ou não a conservá-lo¨...



CAPÍTULO CCXXXVIII

Após curto silêncio, continuou...

...¨O ideal da humanidade é a destruição do capitalismo, e que seja o mais breve possível, pois assim será evitada a destruição maior, o total fracasso planetário. A humanidade não surgiu na Terra para sofrer e devemos, temos que matar o capitalismo para salvar o futuro¨...

...¨Tudo o que vale a pena é bom esperar, não é?¨, observou Isabel, e ele prosseguiu..

...¨Confio muito na juventude das novas gerações. Nossa causa será delas, que nos darão dirigentes diferentes e eliminarão muitos males desse mundo com uma revolução na economia. Tenho razões para ter fé no futuro, numa nova civilização humana com um modelo novo de sociedade, democrática, com equilíbrio social, onde os frutos do trabalho serão repassados para os que trabalham e quiserem viver sem sacanear ninguém. É por isso que o comunismo representa o ideal de sociedade perfeita, de igualdade e justiça social...

...Em outra pausa, ele chorou...

...¨Já começou, a decadência dos Estados Unidos, Isabel, a verdadeira decadência do capitalismo¨...

...¨Ainda bem, assim espero!¨...

...¨Se o capitalismo não for logo abolido da face da terra, daremos razão a Ortega y Gasset, as massas se rebelarão. Ainda bem que já se vislumbra um futuro diferente e justo, de emancipação, uma sociedade fundada no amor, na felicidade e comunhão universal de todos entre si. Este sonho humano de felicidade é viável sem a agressividade e a desconfiança inerentes ao capitalismo, mesquinho e material. No dia em que for destruído o capitalismo, a justiça dará o melhor fruto, a paz!...

...¨Também confio, amor!¨...

...¨O capitalismo é a causa principal da miséria, das desigualdades sociais, da má distribuição de renda, porque o individualismo é a sua característica básica, uma individualidade que é impedida pela própria estrutura massificante do sistema, que a tudo padroniza, da vestimenta ao modo de se comportar à mesa, e essa contradição que faz com que a sociedade se estruture sobre injustiças, porque os interesses são individuais ou de grupos, nunca de um, como teoricamente parece, e isso acaba produzindo vida e liberdade apenas para poucos, porque a única coisa que importa é a satisfação pessoal, que nada mais é do que a essência da vaidade e da humilhação. E no país mais capitalista do mundo, Estados Unidos, a constituição tem a petulância de dizer que todos têm direito à felicidade! Qual é, Mané? O mundo capitalista é um mundo de aparências, onde só se leva em conta a aparência e esquece-se a essência, o que termina pela marginalização do pobre, do diferente. O capitalismo prega que individualmente é que se deve tentar mudar o mundo, mas, embora as mantendo na ignorância, sobrevive das massas. Na hora de acumular riquezas, sim, a questão é individual, e só é bom, só presta quem é ambicioso. Qualquer alternativa que possa levar à felicidade é válida e cada qual deve buscar a melhor, para obter felicidade, e isso já reduz a dignidade a simples valor de troca, o que torna a ética simples moral, utilitária, uma expressão de desejos porque, no capitalismo, Isabel, a felicidade de um decorre da infelicidade de muitos, o que é uma desgraça, porque só trás sofrimento, porque vive-se para competir, jamais para compartilhar ou dividir com o próximo¨...



AMANHÃ OS CAPÍTULOS CCXXXIX, CCXL, CCXLI, CCXLII, CCXLIII E CCXLIV


  

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Editor: Marcos Antonio Moreira
Diretora Executiva: Kelen Marques